sábado, 20 de dezembro de 2008

Unesp deve ter curso de pedagogia a distância em 2009

Unesp deve ter curso de pedagogia a distância em 2009

Fonte: Folha de São Paulo
RAFAEL SAMPAIODA REPORTAGEM LOCAL
As aulas do curso a distância de pedagogia da Unesp (Universidade Estadual Paulista) para professores da rede pública devem começar no segundo semestre de 2009, diz o secretário de Ensino Superior, Carlos Vogt.O vestibular para a graduação -que vai formar até 5.000 docentes dos ensinos infantil, fundamental e médio e durará três anos- está previsto para ocorrer em abril ou maio. O edital da prova deve sair em fevereiro."O curso terá 70 pólos de aulas presenciais espalhados pelo Estado, que usarão estrutura de unidades da Unesp, Fatec [Faculdade de Tecnologia] e também de prefeituras", afirma Vogt.O curso foi aprovado pelo Conselho Universitário da Unesp na quarta-feira. Ele será a primeira graduação das três universidades estaduais paulistas (USP, Unesp e Unicamp) em convênio com a Univesp (Universidade Virtual do Estado de São Paulo) -que pretende criar um sistema de ensino superior a distância.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Pesquisa traz redução de matrículas

Especial Inclusão em Cena
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Caiu o número de alunos com deficiência no ensino básico -que vai da educação infantil ao ensino médio e inclui educação profissional e de jovens e adultos. Em 2006, havia 700.624; em 2007, 669.931, o que significa uma redução de 4,4%.
Segundo o Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), a redução se deve a uma mudança metodológica do sistema de coleta de dados do Censo 2007. Pela primeira vez, utilizou-se o Educacenso, que solicita dados detalhados sobre escola, alunos e professores, eliminando, por exemplo, cadastros duplicados.
Pelo último censo, 46,8% das matrículas são em classes comuns -nas quais há a integração entre alunos deficientes e não-deficientes- do ensino regular e da EJA (Educação de Jovens e Adultos). Outras 41,3%, em escolas exclusivamente especializadas, e 11,9%, em classes especiais do ensino regular e da EJA.
"O MEC tem desenvolvido uma política de educação inclusiva e deve haver uma migração das classes especiais para as regulares", diz a pesquisadora do Diesat (departamento de estudos de saúde e dos ambientes de trabalho) Alecxandra Ito.
Procurado, o MEC não quis comentar os dados.

Não há alunos suficientes, diz associação
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Desde 25 de setembro, com a lei do estágio, as empresas têm de reservar 10% de suas vagas para deficientes. Segundo os cálculos da Abres (Associação Brasileira de Estágios), são 71,5 mil postos para estudantes do ensino superior. Contudo, há 6.960 alunos deficientes de graduação no país, segundo os dados do MEC (Ministério da Educação).

"As empresas procuram, mas não conseguem encontrar estagiários com esse perfil", destaca o diretor-presidente da Abres, Seme Arone Junior. Não apenas, sugere ele, pela falta de alunos na graduação para atender a demanda como também porque os jovens profissionais são disputados pelo mercado.
"As empresas os absorvem como celetistas, para cumprir Lei de Cotas."
A auxiliar administrativa Elem Barbosa, 21, que perdeu dedos e parte do movimento do braço esquerdo, faz parte do grupo que dispensa o estágio.
Ingressou no Grupo Astra, de construção civil, em 2005 e há um ano e meio entrou na faculdade.
"Desde que estou aqui na empresa, não mandei nenhum currículo", diz.
"Por esse assédio das empresas, não sentimos aumento da procura pelo estudante", considera o presidente do Núcleo Brasileiro de Estágios, Carlos Henrique Mencaci.

Curso gratuito é ponte para obter emprego
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Uma das pontes para o mercado de trabalho são os cursos de capacitação de profissionais. É por meio das instituições que ministram esses treinamentos que muitas empresas selecionam seus colaboradores.

Em algumas delas, o índice de absorção desses trabalhadores após a qualificação chega a 85%, a exemplo da Avape. Em 2008, foram 889 pessoas capacitadas e recolocadas.
No caso do IBDD (Instituto Brasileiro dos Direitos da Pessoa com Deficiência), é mantido um banco de dados para encaminhar os 4.000 egressos dos cursos para o mercado. "Recebemos, em média, três pedidos de empresas diferentes por dia -uma oferta de 150 vagas por mês", diz a superintendente da organização, Teresa d'Amaral.
Dos profissionais encaminhados às firmas, complementa ela, 35% foram contratados.

Sem procura
Apesar de ser um canal para conseguir uma vaga, entidades que oferecem cursos gratuitos reclamam da baixa procura.
Uma delas é a Secretaria Estadual do Emprego de São Paulo, que estendeu inscrições de treinamentos para janeiro -o prazo terminava em dezembro.
Nos dez primeiros dias, o programa havia recebido 120 inscrições -para 960 vagas.
Para Juan Sanches, que coordena a iniciativa, há duas causas principais disso: o desinteresse e a Loas (Lei Orgânica da Assistência Social), que assegura um salário mínimo a quem não tem meios de se manter.
Já Danilo Namo, diretor-técnico do Instituto Paradigma, credita a baixa adesão à falta de garantia de emprego.
Há um ano, o instituto parou de oferecer cursos gratuitos, em parte pela baixa procura, e passou a ministrar treinamentos nas empresas. "A inclusão no trabalho é prioritária", diz.
Fonte: FSP 14/12/08

Só 30% dos reabilitados pela Previdência são reinseridos

Especial Inclusão
Problema é a falta de qualificação e de capacitação, justifica ministério

DA REPORTAGEM LOCAL

Oferecida pela Previdência Social, a reabilitação de profissionais acidentados que tiveram a capacidade de trabalho reduzida -com inclusão ou não na Lei de Cotas- promove a reinserção no mercado laboral de apenas 30% dos segurados.

Segundo dados do Ministério da Previdência Social, em 2008, 60.638 segurados foram inscritos no programa de reabilitação. Contudo, apenas 18.064 retornaram para o mercado. Não há estatísticas de quantos acidentes levam à deficiência.
De acordo com Leila Cannalonga, chefe da divisão de Reabilitação Profissional da Previdência, o grande problema desses profissionais é a falta de qualificação e de capacitação.
"Hoje o mercado exige, no mínimo, que a pessoa tenha o ensino médio completo. O que acontece é que grande parte dessas pessoas fez apenas o ensino fundamental ou somente é alfabetizada", afirma.

Aptidão
Cannalonga explica que o programa de reabilitação deve ser recomendado por um perito da Previdência que, com um orientador profissional, atesta não só a capacidade física do trabalhador mas também seu perfil socioprofissional -ou seja, para quais atividades ele está apto para atuar.
A fim de agilizar o atendimento dessas pessoas, o ministério firmou convênios com entidades em todo o país.
No Estado de São Paulo, a parceria é feita com a Avape (Associação para Valorização e Promoção de Excepcionais).
Segundo Eliana Victor, diretora da divisão de reabilitação e inclusão da entidade, 206 pessoas foram atendidas desde agosto, quando foi fechada a parceria com o governo.
"Demos a elas cursos como informática e vendas. Mas não sabemos quantas conseguiram obter uma recolocação."
O empacotador Anderson Antonio dos Santos, 28, que tem movimentos reduzidos na perda direita, foi um dos beneficiados pela reabilitação.
Após fazer alguns cursos, ele conseguiu um emprego em uma editora, onde conferia revistas. "Na Avape, eu fazia dinâmicas de grupo e eles avaliavam minha capacidade de trabalho. Hoje sou empacotador em uma indústria. Vejo que tem bastante oportunidade, mas como só tenho o ensino fundamental, não consegui o melhor posto."
Para driblar essa situação, em janeiro, Santos pretende fazer um supletivo e ainda sonha em fazer faculdade de engenharia mecânica. (MCN)
Fonte: FSP 14/12/08

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

INCLUSÃO EM CENA Especial da Folha

Deficiente mental ganha 48% menos que os demais
Eles representam 2,4% do total de empregados com deficiência no país
CRIPPA COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Prestes a concluir o ensino médio, Tamara Regina de Souza, 21, começou a procurar emprego em escritórios e lojas de departamentos. Passou quase três anos entre testes e entrevistas sem nada conseguir até que uma tia desconfiou de seu desempenho -inferior ao de outras garotas da mesma idade. Levada ao médico, soube que tinha deficiência intelectual leve, conseqüência de ataques epilépticos que sofria desde os sete anos. "Sempre tive dificuldade na escola", comenta. A oportunidade de trabalho só surgiu três anos mais tarde, após freqüentar cursos de capacitação para deficientes. Em fevereiro, começou a trabalhar em uma maternidade, onde confere as guias das pacientes.Ainda que tenha passado por uma via-crúcis para conseguir a colocação, Souza é exceção entre os deficientes intelectuais.Dados do Censo 2000, apurados pelo IBGE (Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), demonstram que 14,5% da população tem algum tipo de deficiência -8,3% são deficientes mentais.
Mas, de acordo com a Rais 2007, do Ministério do Trabalho e Emprego, apenas 2,4% do total de pessoas com necessidade especial empregadas têm deficiência mental. Os deficientes físicos representam 50,3%, e os auditivos, 28,2%.
A discriminação é refletida também nos níveis salariais. Em média, um deficiente intelectual ganha R$ 728 mensais, enquanto a remuneração média dos profissionais deficientes, em geral, é de R$ 1.390 por mês -diferença de 91%.No caso das pessoas com deficiência auditiva, esse valor é de R$ 1.845; no de visuais, R$ 1.413. Segundo a Rais 2007, a média salarial de brasileiros não-deficientes é de R$ 1.356.Dados da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de São Paulo apontam que, de 2001 a julho de 2008, 85.524 pessoas entraram nas empresas por meio da Lei de Cotas. Desse universo, apenas 3.250, ou 4%, são deficientes mentais.
Adaptação
A justificativa de especialistas ouvidos pela Folha é que contratar um deficiente mental requer mais adequações."É um trabalhador que exige mais treinamento, mais prazo para dar retorno e um acompanhamento constante", afirma a psicóloga Maria Aparecida Fernandes Pereira, coordenadora do Programa de Formação Profissional Conte Comigo da Apae (Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais).
Listado como uma das empresas que mais contratam deficientes no Brasil, o Itaú emprega hoje 2.600 funcionários nessas condições -nenhum com deficiência intelectual."Para 2009, queremos não só os incluir mas também criar uma condição de carreira, sem conceito paternalista", adianta Ana Paula Lima, superintendente da área de atração, diversidade e integração do banco.
Deficientes qualificados são maioria no mercado
Dos empregados com deficiência, 53% têm nível médio ou superior
MARIA CAROLINA NOMURA
DA REPORTAGEM LOCAL
Ter qualificação é a exigência mínima para ocupar qualquer posto de trabalho. Para pessoas com deficiência, essa regra não é diferente.De acordo com dados da Rais 2007 (Relação Anual de Informações Sociais, do Ministério do Trabalho e Emprego), das 348.818 pessoas com deficiência inseridas no mercado profissional, 53% têm o ensino médio ou o superior completo."Isso reflete o viés de contratação das empresas, que estão priorizando recrutar pessoas [com deficiência] com nível de escolaridade maior", explica José Carlos do Carmo, um dos coordenadores do programa de inclusão da pessoa com deficiência da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Estado de São Paulo.Investir na educação para se destacar no mercado de trabalho foi a aposta do professor de artes plásticas do Colégio Santa Maria, Paulo Pitombo, 49, deficiente visual."O mercado é muito exigente e tentei me qualificar ao máximo. Além da competência, tive que mostrar credibilidade", conta ele, que tem mestrado pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).
Excluídos
A realidade da inclusão, contudo, não é otimista, na avaliação do assessor da Secretaria de Inspeção do Trabalho Rogério Reis. "As empresas optam por contratar pessoas com deficiências mais leves. O número total de trabalhadores poderia ser dobrado se a cota estivesse sendo cumprida", afirma. Pela Lei de Cotas, companhias com mais de cem funcionários têm de reservar de 1% a 5% de vagas para deficientes, conforme o número de colaboradores. No Brasil, o Censo 2000, do IBGE (Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), aponta que 14,5% da população -24,5 milhões de pessoas- tem alguma deficiência. falta de fiscalização, diz Reis, é um dos grandes entraves para o cumprimento da norma. "As empresas ainda alegam que os profissionais não são qualificados nem capacitados."A fim de driblar essa situação, o Ministério do Trabalho e Emprego lançou, em novembro, um projeto piloto em nove Estados para incitar a inclusão. O objetivo é oferecer à empresa a alternativa de capacitar as pessoas com deficiência como aprendizes durante dois anos. "Após esse período, ela terá de contratá-los pela cota."
Fonte: FSP 14/12/08
Comentário: Alega-se que a baixa qualificação é o que impede a contratação de muitos deficientes. Com as políticas de Educação Inclusiva do Governo Federal isto vem caíndo por terra e vai ficando mais evidente que se trata da procura de um funcionário que se enquadre em um determinado padrão. Não se pensa em reestruturação da empresa para que ela seja inclusiva, pois a reenstruturação visa apenas aos lucros e o investimento em pessoas com deficiência, no início, pode gerar algumas despesas, que serão compensada a longo prazo. Da mesma forma, nada justifica o baixo salário de pessoas "classificadas" muitas vezes indevidamente, como pessoas com deficiência intelectual. Novamente é a tentativa de enquadra o empregado na empresa e não a empresa às demandas sociais, das quais ela depende e é sustentada. Lembra a mesma discussão sobre produção sustentável, com as mesmas alegações que hoje se mostram grandes engodos.

Dentistas adotam agulhas e hipnose

Conselho Federal de Odontologia aprova práticas como acupuntura e homeopatia no consultórioProcedimentos têm ação analgésica e anestésica; profissionais terão de fazer cursos para utilizá-los nos consultórios odontológicos
CLÁUDIA COLLUCCIDA
REPORTAGEM LOCAL
Dentistas passam a tratar pacientes com acupuntura, homeopatia, fitoterapia, hipnose e terapias florais a partir de 2009. A inclusão dos procedimentos nos consultórios foi aprovada pelo CFO (Conselho Federal de Odontologia). Profissionais terão de fazer cursos para exercerem as práticas.Há dois anos, o governo federal lançou uma portaria recomendando alguns desses tratamentos no SUS. O uso da acupuntura gerou uma série de protestos de entidades médicas, que defendiam o procedimento como ato médico por necessitar de diagnóstico e ser uma prática invasiva. Ontem, o CFM (Conselho Federal de Medicina) informou que não sabia da decisão do CFO. Por lei, os dentistas podem prescrever medicamentos e terapias relacionadas ao tratamento odontológico.
Alguns dentistas brasileiros já têm adotado essas práticas alternativas durante os tratamentos, mas, até agora, não havia nem aval do CFO nem exigência de habilitação."Já era tempo de a odontologia humanizar o tratamento de forma segura e com menos custo e menos sofrimento para o paciente", afirma o dentista Emil Adib Razuk, presidente do Conselho Regional de Odontologia de São Paulo. Segundo Razuk, a acupuntura, por exemplo, tem ação analgésica e anestésica e pode, em casos específicos, até substituir procedimentos consagrados. "Temos pacientes alérgicos à anestesia que poderão ser muito beneficiados. Os que sofrem de disfunção temporomandibular também têm alívio da dor [com o uso da agulhas]."O cirurgião dentista Marco Antonio Lopes Salinas, que já adota a acupuntura na sua prática clínica, diz que, além de aliviar a dor, a técnica reduz os níveis de ansiedade do paciente. "É extremamente útil nos tratamentos periodontais [raspagens dos dentes para a retirada do tártaro, por exemplo]". Ele relata que as agulhas também já foram capazes de reduzir a pressão arterial de um paciente e aliviar a ânsia de vômito de outro durante um procedimento de moldagem. "Foram situações surpreendentes pela rapidez da resposta."Salinas diz que costuma aplicar as agulhas em pontos espalhados pelo corpo ou nas mãos e no pulso, dependendo de cada situação. Uma minoria (cerca de 20%) de pacientes rejeita a técnica, segundo o dentista.
Hipnose
Outra prática aprovada pela CFO é a hipnose, que alguns dentistas já utilizam associada à inalação de óxido nitroso e oxigênio (hipnoanalgesia). Na inalação, o paciente fica levemente sedado e, por isso, mais suscetível à indução pela palavra, segundo Razuk.Hoje não se usa mais objetos como o pêndulo. O estado de hipnose é induzido somente pela voz do profissional. Com o polegar na testa do paciente, o dentista sugere que ele mentalize locais bonitos, calmos e aconchegantes e, aos poucos, ele vai entrando em transe hipnótico. "O condicionamento hipnótico é fundamental para o paciente aflito", diz Razuk. Sobre os medicamentos homeopáticos e fitoterápicos, Razuk aponta como principal vantagem um menor risco de efeitos colaterais e de interações medicamentosas. No caso das terapias florais, não há uma ação específica no tratamento, mas a promessa de um "reequilíbrio energético".
Formação
A nova resolução do CFO diz ainda que os cursos que irão habilitar os dentistas a exercer uma ou mais dessas práticas devem ser ministrados por instituições credenciadas.
Os profissionais que já adotam as técnicas só poderão continuar com as atividades se apresentarem certificados atestando a habilidade. Só serão aceitos documentos emitidos por instituições de ensino superior ou por entidades credenciadas no MEC e no CFO. Outra forma de comprovação será por meio da apresentação de um memorial que comprove o exercício da prática por, no mínimo, cinco anos - desde que esse período tenha ocorrido na última década- ou de uma prova na presença de uma banca.
Fonte: FSP, caderno Saúde 16/12/08

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Na hora de estresse, mantenha a mente aberta

Fonte: The New York Times e Folha de São Paulo

ENSAIO


Na hora de estresse, mantenha a mente aberta

GREGORY BERNS

Minha sensação é que o trabalho está ficando cada vez mais semelhante a uma caixa de Skinner.
Uma caixa de Skinner é uma câmara condicionadora operante - em outras palavras, uma gaiola que treina um animal de laboratório a fazer associações automáticas entre alavancas e luzes piscantes, de um lado, e recompensas e castigos, do outro. Ela foi inventada na década de 1950 por B.F. Skinner, um psicólogo experimental, para estudar o aprendizado.
A luz verde pisca, ou o animal empurra a alavanca certa, e então ele é recompensado com um pedaço de alimento. Mas algumas câmaras condicionadoras operantes são feitas com pisos eletrificados.
Uma luz vermelha se acende, e zap! O camundongo não demora muito a perceber que luz se acende com o choque elétrico e qual delas é associada ao alimento.
Todos os animais são bons em fazer essas associações - até mesmo nós, primatas.
Não demora muito para nem sequer precisarmos da luz: a simples visão de caixa é capaz de levar alguns de nós a um estado de apoplexia.
O local de trabalho não chega a ser uma caixa eletrificada, mas acho que preferiria um choque elétrico de curta duração aos choques intermitentes das quedas diárias nas bolsas ou das sucessivas ondas de demissões nas empresas.
Todo o mundo está com medo. O medo dos trabalhadores se generalizou para seus locais de trabalho e para tudo o que está relacionado ao dinheiro. Estamos presos numa espiral em que temos tanto pavor de perder nossos empregos e nossas economias, e esse medo toma conta de nossos cérebros. Embora seja um instinto adaptativo e profundamente arraigado de autopreservação, o medo também impede que nos concentremos em qualquer coisa senão salvar nossas peles, em sair da caixa intactos.
Nada de bom pode sair desse tipo de processo decisório. Justamente quando mais precisamos de novas idéias, todo o mundo está paralisado de medo, tentando manter o que ainda resta.
Sou neuroeconomista, o que significa que uso tecnologia de escaneamento cerebral para decodificar o processo decisório humano. Meus colegas e eu fizemos um experimento com nossa versão própria de uma caixa de Skinner.
Em vez de estarem numa caixa, os participantes ficaram num aparelho de ressonância magnética. Em vez de piso eletrificado, prendemos eletrodos a seus pés. Embora não fossem demasiado dolorosos, a intenção era que os choques fossem suficientemente desagradáveis para que a pessoa preferisse evitá-los por completo.
O ponto central do experimento era que os sujeitos tinham que esperar pelos choques. E, para muitas pessoas, a espera era a pior parte. Quase um terço tinha tanto meda da espera que preferia receber um choque maior imediatamente a aguardar um choque menor mais tarde. Soa ilógico, mas o medo - seja da dor ou de perder o emprego - exerce efeitos estranhos sobre o processo decisório.
Algumas pessoas demonstraram forte condicionamento pelo medo, evidenciado pelo uso de recursos neurais para enfrentar o choque iminente. A maior parte dessa atividade ocorria nas partes do cérebro que processam a dor.
Essa preocupação toda gastou energia, de modo que essas pessoas que apresentaram reações extremas tinham menos poder de processamento neural disponível para outras tarefas.
A neurociência nos diz que, quando o sistema de medo do cérebro está ativo, a atividade exploratória e a atividade de tomada de riscos estão desligadas. Assim, a primeira coisa que é preciso fazer é neutralizar esse sistema.
Isso significa não disseminar o medo entre as outras pessoas. Significa evitar pessoas que são excessivamente pessimistas em relação à economia. Significa desligar a mídia que alimenta chamas emocionais. Significa estar preparado, mas não hipervigilante.
O que eu estou fazendo agora é procurar novas oportunidades. Isso quer dizer aplicar a neurociência a áreas em que ela ainda não foi usada. Estou colaborando com antropólogos para usar imageamento cerebral para compreender as raízes biológicas dos conflitos políticos. Estou iniciando outro projeto para usar o imageamento cerebral para prever quais adolescentes têm a probabilidade de fazer julgamentos fatalmente ruins e, esperamos, treiná-los a tomar decisões melhores.
Essa estratégia conserva ativo o sistema exploratório de meu cérebro. Sim, esses novos projetos encerram riscos e alguns deles vão fracassar. Mas, enquanto outros esperam a tempestade passar, eu estou ocupado, estendendome para novas áreas. Se eu esperar o dinheiro começar a chegar outra vez, as oportunidades terão passado.


O médico Gregory Berns dirige o Centro de Neuropolítica da Universidade Emory em Atlanta, Geórgiav

Ciclos: Método também é adotado em outros países

Método também é adotado em outros países

DA SUCURSAL DO RIO

Fonte: Folha de São Paulo

O sistema de ciclos é usado em vários países e não tem impacto negativo no desempenho dos alunos, segundo estudo divulgado em 2007 pelo pesquisador Serguei Soares, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), que utilizou como base de comparação o resultado de vários países em exames internacionais.
Soares cita que, em países como Austrália, Coréia do Sul, Japão, Noruega ou Suécia, é proibido reprovar um aluno que esteja cursando o ensino fundamental.
Em outros, como Chile ou Cingapura, a reprovação é permitida apenas em algumas séries -ou limitada a um percentual.
O estudo mostra que os melhores desempenhos foram de países em que a repetência é proibida ou limitada. E isso não se deve apenas ao fato de serem nações mais ricas, pois Soares considerou os indicadores sociais e econômicos na comparação.

Professores foram contrários à forma de implantação de ciclos

Professores foram contrários à forma de implantação de ciclos

Sindicatos apontam vantagens no sistema, mas dizem que ele também pode ser usado para maquiar dados da educação

No Rio e em SP, modelo foi também tema de debates em campanhas eleitorais e chegou a ser taxado de "aprovação automática"

DA SUCURSAL DO RIO

Fonte: Folha de São Paulo

Rio e São Paulo, recentemente, vivenciaram momentos em que o debate sobre a qualidade da educação parecia se limitar à adoção ou não de ciclos. Nos dois Estados, os sindicatos dos professores se posicionaram criticamente à implementação do sistema, argumentando que o problema estava na forma como isso ocorreu.
Em São Paulo, as discussões chegaram ao seu auge nas eleições para o governo do Estado, em 2002, quando os candidatos José Genoino (PT) e Paulo Maluf (do então PPB) atacavam com freqüência o que chamavam de "aprovação automática" da gestão dos tucanos Mário Covas e Geraldo Alckmin.
Maria Izabel Noronha, presidente da Apeoesp (sindicato dos professores de SP), diz não ter ficado surpresa com o fato de um estudo mostrar que não há perda na qualidade. "Considero o sistema um avanço por ser menos excludente. O que criticamos foi a forma autoritária com que foi implementado em São Paulo, sem a preocupação de formar o profissional e dar a ele insumos para trabalhar adequadamente."
No Rio, o ponto alto do debate ocorreu neste ano, quando quase todos os candidatos à prefeitura -com exceção da candidata de situação- criticaram a ampliação do sistema de ciclos na gestão Cesar Maia (DEM). O eleito, Eduardo Paes (PMDB), inclusive prometeu acabar com o sistema em seu primeiro ato de governo.
Também no Rio, o sindicato dos professores foi uma das principais vozes contrárias.
"Se houver um trabalho para que o ciclo seja praticado, ele é eficaz. Mas o que aconteceu no Brasil é que vários governos aproveitaram essa idéia apenas para maquiar a má qualidade do ensino, já que a reprovação e o abandono diminuem se você não repetir nenhum aluno", afirma Vera Nepomuceno, diretora do sindicato.
Segundo ela, tanto no sistema seriado quanto no de ciclos há cada vez mais alunos chegando ao ensino médio com problemas que deveriam ter sido sanados na alfabetização. "Com o ciclo, no entanto, o problema é mais camuflado, mas ele não é o vilão da história."

Sistema de ciclos não piora ensino, diz estudo

Sistema de ciclos não piora ensino, diz estudo
Pesquisa aponta que alunos que estudam nesse método apresentam notas bastante semelhantes às dos alunos do sistema seriado

Nos ciclos, estudantes não podem ser reprovados em todas as séries; sistema tem taxas menores de evasão e de repetência de alunos

ANTÔNIO GOIS
DA SUCURSAL DO RIO
Fonte: Folha de São Paulo

Poucos debates educacionais mobilizaram tanto recentemente a sociedade quanto a adoção do sistema de ciclos. Objeto de discussões acaloradas em debates eleitorais, muitos políticos acusaram o modelo de ter piorado a qualidade de ensino com a "aprovação automática" de alunos sem base.
Um estudo a partir do desempenho de estudantes na Prova Brasil (avaliação do MEC que monitora a performance de alunos em português e matemática) traz um pouco de luz à discussão, mostrando que praticamente não há diferença nas notas em sistemas de ciclos -em que a reprovação não ocorre todo ano- e seriados.
O trabalho foi elaborado pelos pesquisadores Naércio Menezes Filho (USP e Ibmec), Lígia Vasconcellos, Sérgio Werlang e Roberta Biondi (os três últimos do Banco Itaú).
Pela primeira vez, eles utilizaram dados da Prova Brasil para comparar os sistemas.
A primeira comparação feita pelos autores do estudo é favorável aos alunos no sistema de ciclos, pois mostra que o desempenho deles nas provas de português e matemática é melhor, variando de uma diferença de 0,9% (na prova de matemática na 8ª série) para 4,4% (em português na 4ª série).

Nível socioeconômico
Isso, no entanto, não é suficiente para comprovar que o sistema de ciclos seja melhor, já que a diferença poderia ser devida ao fato de esses estudantes terem nível socioeconômico mais elevado e estarem em escolas mais bem equipadas.
Para captar melhor o efeito dos ciclos, os autores refizeram o cálculo, mas, desta vez, levando em consideração características das escolas e das famílias -que, já se sabe, têm peso significativo no rendimento.
Em outras palavras, eles comparam estudantes nas mesmas condições e com mesmas características.
O resultado mostra que a diferença passa a ser favorável a alunos no sistema seriado, mas é mínima. Na 4ª série, as notas dos estudantes em escolas que adotam o sistema seriado foi apenas 1% superior, diferença que fica dentro da margem de erro do levantamento.
Já na 8ª série, a diferença é um pouco maior: 1,8% em matemática e 1,4% em português.
Os autores do estudo fazem uma leitura favorável desses dados ao sistema de ciclos. Eles mostram que as taxas de reprovação e abandono são menores nesse regime, o que faz com que mais alunos consigam completar o ensino fundamental.
Argumentam ainda que, mesmo com a queda na qualidade, os efeitos futuros no rendimento de um estudante formado no sistema de ciclos compensam a pequena perda de rendimento, já que, quanto mais escolarizado, maior é a renda do trabalhador.
Eles levantam duas hipóteses para o desempenho ligeiramente menor na 8ª série. A primeira é que, no sistema de ciclos, há menos empenho do estudante ao saber que ele não será reprovado todo ano.
A segunda é que, nesse regime, mais alunos de menor nível socioeconômico conseguem chegar à 8ª série, o que acaba tendo impacto nas médias da turma. No sistema seriado, argumentam, esses jovens provavelmente já teriam abandonado a escola ou estariam retidos em séries mais atrasadas.
Lígia Vasconcellos diz que não deve se esperar que a simples adoção de ciclos aumente o desempenho. "É preciso ter mais qualidade, mas não é a progressão continuada que vai explicar a melhora ou a piora."

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Deputados aprovam bônus para educação

DA REPORTAGEM LOCAL
A Assembléia Legislativa de São Paulo aprovou na noite de anteontem o projeto enviado pelo governo José Serra (PSDB) que prevê o pagamento de bônus por desempenho aos servidores da educação. Para valer, a proposta deve ser homologada pelo governador.O bônus por desempenho substitui a gratificação que era calculada apenas com base nas faltas dos servidores e custou R$ 450 milhões neste ano.Ele vai dar até 2,4 salários a mais (20% do rendimento do ano) a todos os profissionais das escolas que atingirem as metas de melhoria anual estipuladas com base no Idesp -índice estadual que considera o desempenho dos alunos nas provas do Saresp e as taxas de aprovação e abandono.O bônus será proporcional ao desempenho da unidade (se atingir apenas metade da meta, será pago 1,2 salário). Se a escola ultrapassar o objetivo, a bonificação chegará a 2,9 salários.Também será considerado, individualmente, o absenteísmo. Se o servidor, por exemplo, cumprir metade da carga horária, receberá metade do bônus fixado para sua escola.
Fonte: FSP 12/12/08

Comentário: Fala-se em incentivo e valorização do trabalho do educador, entretanto, a que se pensar neste tipo de atitude, quais as conseqüências para o sistema de educação e para a saúde dos trabalhadores envolvidos. Ficam-nos algumas dúvidas: o referente bônus é apenas para professores ou é também para funcionários não docentes? As metas são apenas índice de aprovação (com a progressão continuada???, do que estamos falando?), abandono escolar (sem nenhuma outra proposta de trabalho de indentificação das razões para este abandono e ações de combate a isso?), e por fim o Saresp (correndo o risco de invertermos a lógica da avaliação e de construirmos um sistema de educação que vise à prova e não uma prova que vise nos dar pistas de pontos de melhora do sistema de educação!). Além disso, é preciso trabalhar fortemente nos problemas que levam ao adoecimento dos educadores docentes e não docentes, e não trocar a saúde destes por dinheiro, ou no caso, a ida ao médico, ou um tratamento de saúde pelo bônus! Alecxandra Ito

Comentário: Fala-se em incentivo e valorização do trabalho do educador, entretanto, a que se pensar neste tipo de atitude e quais as conseqüências para o sistema de educação e para a saúde dos trabalhadores envolvidos. Alguns pontos: o referente bônus é apenas para professores ou é também para funcionários não docentes? As metas são apenas índice de aprovação (com a progressão continuada???, do que estamos falando?), abandono escolar (sem nenhuma outra proposta de trabalho de indentificação das razões para este abandono e ações de combate a isso?), e por fim o Saresp (correndo o risco de invertermos a lógica da avaliação e de construirmos um sistema de educação que vise à prova e não uma prova que vise nos dar pistas de pontos de melhora do sistema de educação!). Além disso, é preciso trabalhar fortemente nos problemas que levam ao adoecimento dos educadores docentes e não docentes, e não trocar a saúde destes por dinheiro,

Atendimento à vítima: SP tem 9 delegacias para 5,7 milhões de mulheres

COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
São muitas as dificuldades enfrentadas por vítimas de violência sexual. "Desce daí, menina, não é para subir aí. Você já é grande. Vai fazer bagunça lá fora", gritava a atendente da 1ª Delegacia de Polícia de Defesa da Mulher, no centro de São Paulo, para uma menininha de quatro anos, recém-violentada por um vizinho de 18 anos.A menina foi levada ao local pela mãe, que escutou da mesma atendente (o nome dela é Dagmar) uma bronca porque não conseguia se lembrar do endereço de casa."Você não sabe o nome da rua em que você mora? Eu tenho uma sobrinha de três anos que já sabe o próprio endereço, e você não?"A mãe queria prestar queixa e chegou à delegacia levada pela polícia, depois de procurar o hospital Pérola Byington.A cena foi presenciada pela Folha que, até então, não havia se identificado para a atendente. Assim que soube que havia uma repórter no local, Dagmar disse que "adora crianças".Em São Paulo existem nove delegacias para uma população de 5,7 milhões de mulheres. A Folha visitou as nove unidades. Em nenhuma havia assistentes sociais ou psicólogos formados -algumas tinham apenas estudantes. Nenhuma funciona durante os finais de semana. Em duas delegacias não havia papel higiênico no banheiro. Em seis delas -junto a uma delegacia comum- o banheiro ficava a dois andares de distância.
Para delegada, atendimento é adequado
A delegada diligente do serviço técnico de apoio às delegacias de defesa da mulher, Márcia Salgado, afirma que ainda não existe uma rede institucionalizada de apoio à mulher, mas que todas as delegacias encaminham as vítimas aos centros de referência mais próximos. Para ela, isso é mais adequado do que ter um atendimento psicológico ou social dentro da delegacia, que não tem um ambiente que "deixa a mulher à vontade" para esse tipo de tratamento.Ela ressaltou que nenhuma delegacia da mulher desestimula as mulheres a prestarem queixa.A Secretaria de Segurança Pública informou que há papel higiênico nos banheiros das delegacias e disse que, qualquer pessoa que se sentir ofendida injustamente por um policial, deve prestar queixa na Corregedoria da instituição. (TB)
Fonte: FSP 12/12/08

Hospital de referência para mulher atende mais crianças

Dos 1.907 casos atendidos no Pérola Byington, 1.427 eram de jovens e 480 de adultosReferência no tratamento de mulheres vítimas de violência sexual, hospital em SP fez metade dos abortos legais registrados no país neste ano

LAURA CAPRIGLIONEDA
REPORTAGEM LOCAL
TALITA BEDINELLI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Os 11 médicos, assistentes sociais e psicólogos estão reunidos com solenidade no quarto andar do hospital Pérola Byington (região central de São Paulo). Vão decidir se aprovam ou não o pedido de interrupção de gravidez, feito por uma jovem estuprada.O médico Jefferson Drezett, 47, coordenador do Serviço de Atenção Integral à Mulher em Situação de Violência Sexual, solicita a uma ginecologista que relate o caso. Maria [o nome é fictício] foi atacada em um estacionamento. O agressor deixou seu sêmen e mais o vírus HPV, que causou o brotamento de verrugas dolorosas na região genital da jovem. A ultra-sonografia atribui ao feto idade gestacional de dez semanas. É compatível com a data em que a vítima alega ter sido violentada.Uma psicóloga confirma o trauma sofrido. A assistente social relata a entrevista feita com Maria, 23, moça tímida, católica, moradora na periferia, que até hoje não juntou coragem para contar a ninguém -exceção feita ao serviço do Pérola Byington- o que lhe aconteceu naquele estacionamento.Ela só chegou lá, hospital especializado em saúde da mulher, por causa das verrugas e de uma indisposição geral. Logo depois do estupro, foi para casa, tomou um banho. Não foi à polícia. No Pérola, acabou contando tudo. Ela não quer o filho. Tem medo de que se pareça -física ou moralmente- com o homem que a estuprou. Quer esquecer a violência.Conferida a consistência da história contada pela jovem, lidos os relatórios, confrontados os exames médicos, os presentes decidem: interromperão aquela gestação (o Código Penal autoriza a intervenção em caso de estupro ou risco de morte para a gestante). Aproveitarão a anestesia para cauterizar as verrugas.Drezett quer o máximo empenho da psicóloga para que a jovem siga em tratamento -ela tem de lidar com o trauma.Há 15 anos, o serviço de violência do hospital Pérola Byington é uma ilha de excelência no acolhimento e tratamento de vítimas de violência sexual. Funciona 24 horas por dia, todos os dias do ano.E não só para mulheres. Por falta de serviços semelhantes, dos 1.907 casos atendidos no Pérola de janeiro até outubro deste ano, 898 (47% do total) eram crianças até 11 anos, inclusive meninos. Adolescentes de 12 a 17 anos constituíram um total de 529 casos. Os 480 restantes foram de adultos.A empregada doméstica Pilar [o nome é fictício], 27, entrou na sala da assistente social com a filha de um ano no colo.A menina chora o tempo todo. Está nervosa, irritada. Mãe e filha foram enviadas ao Pérola por um conselheiro tutelar de Itapevi, município da Grande São Paulo. A região vaginal da garotinha está "em carne viva", diz a mãe.O médico do posto de saúde de Itapevi "nem quis olhar", ela conta. "Mandou nós para a delegacia." O delegado chamou o conselheiro, que deu o dinheiro do trem e despachou a mãe para o Pérola, único hospital do tipo com uma unidade do Instituto Médico Legal focada em sexologia forense.O resultado do IML demora 30 dias para sair. É no Pérola que a filha de Pilar recebe encaminhamentos: para uma creche (a babá da menina é suspeita de ser a agressora, segundo a polícia) e para um pediatra, para enfim ser tratada.Segundo Drezett, 2008 deverá ser o ano recordista de atendimentos de crianças vítimas de violência sexual. "Não é que estejamos vivendo uma epidemia de pedofilia. É que o problema está sendo tratado de maneira mais aberta, há mais visibilidade", diz.Ontem, a equipe provocou o abortamento na moça cujo caso foi contado no início deste texto. Foi o 57º deste ano (a metade de todos os abortos feitos legalmente no Brasil). No térreo, Jéssica [nome fictício], estuprada quando ia trabalhar, recebia um coquetel de drogas anti-HIV e contra doenças sexualmente transmissíveis, além da pílula do dia seguinte, para evitar que engravide.
Fonte: FSP de 12/12/08

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Projeto de lei reabre debate sobre dislexia

Proposta que tramita na Câmara propõe programa para diagnosticar crianças com dislexia na rede municipal de ensino. Especialistas da Unicamp e da USP dizem que conceito de dislexia é polêmico e que problemas são confundidos com distúrbio neurológico
FLAVIA MANTOVANI
DA REPORTAGEM LOCAL
Um projeto de lei que tramita na Câmara Municipal de São Paulo reacendeu uma discussão que divide médicos, psicólogos e fonoaudiólogos. Proposto pelo vereador Juscelino Gadelha (PSDB), o texto cria um programa para diagnosticar crianças com dislexia na rede municipal de ensino.Aprovado em primeira instância, o projeto foi feito em parceria com entidades como a ABD (Associação Brasileira de Dislexia). Como reação, especialistas de instituições como o CRP (Conselho Regional de Psicologia), a USP (Universidade de São Paulo) e a Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) criaram um manifesto contrário, que, até ontem, tinha 1.785 assinaturas.Eles defendem que o conceito de dislexia é polêmico e que o que costuma ser diagnosticado como distúrbio neurológico genético, na verdade, não o é.
"O que está confirmado é a perda do domínio da linguagem escrita após uma lesão. Mas a dislexia como um problema neurológico da criança com dificuldade para ler e escrever nunca foi comprovada", diz a pediatra Maria Aparecida Affonso Moysés, professora da Unicamp.Segundo ela, o problema tem a ver com fatores externos. "Pode ser uma educação inadequada, uma criança muito pressionada ou sem limites. E a escola brasileira tem muitos problemas, é cômodo pôr a culpa no aluno e estigmatizá-lo." Moysés cita ainda diferenças no ritmo do aprendizado de cada um. "Quem destoa do padrão é colocado como doente."
Ela critica o fato de muitas crianças disléxicas tomarem remédios, não para dislexia -não existem-, mas para TDAH (transtorno de déficit de atenção e hiperatividade), que muitas vezes acompanha o diagnóstico. Segundo Abram Topczewski, neuropediatra do hospital Albert Einstein e vice-presidente da ABD, 75% dos disléxicos têm déficit de atenção e 35%, hiperatividade. Para quem defende o projeto, não há dúvidas da existência da dislexia. Foi criado outro manifesto, com 1.163 assinaturas até ontem, a favor do texto.
Pesquisas
Segundo Topczewski, estudos provam que se trata de um distúrbio neurológico, ligado a alterações anatômicas no cérebro. "Exames de ressonância magnética também encontram alterações localizadas, e estudos genéticos mostram cromossomos envolvidos." Segundo a ABD, de 5% a 17% da população mundial é disléxica. Topczewski diz que as pessoas com dislexia já nascem com o problema e que, quando um dos pais é disléxico, a probabilidade de o filho ter o problema é de 40%.
A explicação de Carla Angelucci, membro da diretoria do CRP, que assina o manifesto contra o projeto, é outra. "A dislexia é mais comum entre meninos pobres. Muitas vezes, os pais também tiveram pior escolarização e não conseguem ajudar os filhos nas dificuldades escolares", diz ela, que considera o projeto parte da "medicalização" de questões sociais.
Marchetti, presidente da ABD, afirma que o contexto escolar e social é levado em conta -para descartar a dislexia. Ela defende a necessidade de diagnosticar precocemente o distúrbio. "São crianças com inteligência normal, mas chamadas de burras. Muitas são derrotadas pela auto-estima", diz ela, que descobriu ter dislexia já adulta, ao receber o diagnóstico do filho. O diagnóstico de Celso Barbosa, 11, veio cedo: aos seis anos. "Ele não conseguia decorar o alfabeto, juntar as palavras, mas era esperto, eu sabia que não era déficit intelectual", diz a mãe, Clarice Barbosa. Após tratamento com fonoaudióloga e psicóloga, Clarice vê melhora. "Ele percebia que era diferente, ficava encolhido. Hoje, tira boas notas."Antes da segunda votação do projeto de lei, os dois grupos organizarão um seminário na Câmara para discutir o tema.
Frases
"A perda da linguagem escrita após uma lesão está comprovada. Mas a dislexia como um distúrbio da criança com problemas de aprendizado nunca foi confirmado"
MARIA APARECIDA AFFONSO MOYSÉS
pediatra e professora da Unicamp
"A dislexia é um distúrbio neurológico, ligado a alterações anatômicas. Exames de ressonância magnética também encontraram alterações, e estudos mostram cromossomos envolvidos"
ABRAM TOPCZEWSKI
neuropediatra do Einstein
Fonte: FSP 09/12/08 - Caderno Saúde
Esta reportagem merece um comentário. A Prof Dra. Maria Moysés, pediatra citada na reportagem, vem ao longo de muitos anos de pesquisa trabalhando com o tema dos problemas de aprendizagem. Ela e outros pesquisadores da USP e da Unicamp, verificando os resultados das pesquisas a que se refere o neuropediatra Topczewski, verificou falhas na própria metodologia de coleta, ou ainda conclusões não sustentadas pelos resultados da pesquisa. Da mesma forma, as tais alterações anatômicas encontradas nas ressonâncias, bem como os 'cromossomos' não são prova de distúrbio neurológico, pois já foram encontrados sinais em vários cromossomos e em diversos lugares no cérebro, conforme a pessoa que lê o exame, significando não há um consenso entre os pesquisadores que acreditam em tal afirmação de distúrbio, mas que há um interesse financeiro muito grande por trás da "prova" de tal distúrbio para a indústria farmacêutica. Esta última vêm aumentando vertiginosamente a prescrição e venda do medicamento para o tratamento deste distúrbio, e quer ampliar ainda mais, como vimos na reportagem postada anteriormente a esta.
Não é uma questão de colocar o problema apenas no contexto social da criança, mas de não colocar a culpa pelos problemas de aprendizagem dos alunos apenas neles mesmos ou em sua herança genética, 'sem cura', pois os problemas dos sistemas de ensino, em conjunto com diversos outros fatores é que vêm levando a um aumento das queixas de problemas de aprendizagem, e o tal diagnóstico precoce não tem auxiliado a melhorar esse quadro, mas ao contrário, tem feito as crianças e famílias afundarem ainda mais no estigma. Alecxandra Ito

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Ritalina: No Brasil, discussão é prematura

Fonte: Folha de São Paulo

No Brasil, discussão é prematura

DA REPORTAGEM LOCAL

Um dos pesquisadores no Brasil que mais conhece os efeitos da Ritalina é o argentino Martín Cammarota, da PUCRS (Pontifícia Universitade Católica do Rio Grande do Sul). Em parceria com o neurocientista Iván Izquierdo e outros colegas, ele conduziu o primeiro estudo em pessoas mostrando o efeito da droga sobre a persistência de memórias adquiridas horas atrás. Antes disso, os efeitos conhecidos eram relacionados à atenção.
Ainda assim, Cammarota disse à Folha que discutir o uso de Ritalina para desempenho acadêmico é prematuro, sobretudo no Brasil. "O melhor aprimoramento cognitivo que estudantes brasileiros podem ter é assistir a aulas de professores que não ganhem só R$ 200 de salário", afirma. "Essa discussão toda é um pouco ingênua."
Segundo o neurocientista, é equivocado chamar a Ritalina de aditivo para a cognição. "O que ela faz é melhorar certas partes do aspecto de processamento de memória", diz. "Não foi demonstrado ainda que essas drogas aumentam a cognição, a inteligência. Nenhum burro vai se converter em um Einstein porque toma dez quilos de Ritalina toda semana."
Para Cammarota, demonizar o uso de drogas "off label" também não é o caso. "Eu não negaria a ninguém a liberdade de tomar Ritalina, mas diria que a chance de que isso faça bem a você é muito pequena se você não tem nenhuma patologia que requeira isso."
Uma vez que se tome cautela com a questão da segurança, diz o neurocientista, não deve haver razão a priori para a proibição. "Quando aplico provas aqui, não faço testes nos alunos para saber o que eles tomaram antes", afirma. "Hoje, você pode conseguir em qualquer lugar o Viagra, que é uma droga que também tem efeitos colaterais. Por que não a Ritalina? Hoje em dia, discutir o sexo é menos tabu do que discutir a cognição e a inteligência humana." (RG)

Grupo de cientistas pede liberação de doping mental

Fonte: Folha de São Paulo

Grupo de cientistas pede liberação de doping mental

Manifesto discute a regulamentação de droga usada para "turbinar" a inteligência

Em pessoas saudáveis, medicamentos usados para tratar o déficit de atenção, como a Ritalina, parecem estimular a concentração

DA REPORTAGEM LOCAL

Um manifesto assinado por pesquisadores de sete universidades líderes nos EUA e no Reino Unido pede que o uso de drogas com o fim de melhorar a inteligência seja regulamentado e, eventualmente, liberado. Em artigo ontem no site da revista "Nature" (http://www.nature.com/), os acadêmicos argumentam que é preciso disciplinar o uso que pessoas saudáveis fazem de medicamentos como a Ritalina (metilfenidato).
Concebida para tratar crianças com TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção por Hiperatividade), essa droga (e outras similares) parece ter um efeito de melhora na concentração e na memória também em adultos saudáveis.
Um levantamento conduzido neste ano em universidades americanas revelou que cerca de 7% dos estudantes já fizeram uso de medicamentos desse tipo pelo menos uma vez, na tentativa de melhorarem seus desempenhos acadêmicos.
Tecnicamente, nos EUA, isso é crime, porque envolve comércio de uma droga para uso "off label" -fora do propósito original para o qual foi aprovada. Cientistas argumentam porém que a medida é um exagero e drogas como a Ritalina poderiam ser liberadas para "aprimoramento cognitivo", desde que novos testes comprovem sua segurança.
"Propomos ações que vão ajudar a sociedade a aceitar os benefícios do aprimoramento, acompanhadas de pesquisa apropriada e regulamento avançado", escrevem os cientistas. "Isso tem muito a oferecer para indivíduos e sociedade, e uma resposta apropriada por parte de todos deve incluir a disponibilização dos aprimoramentos acompanhada da gestão de riscos."

Sono e cansaço
Entre os nomes que assinam o documento estão "pesos-pesados" das neurociências, como Michael Gazzaniga, da Universidade da Califórnia em Santa Barbara, e também um jurista, Henry Greely, da Universidade de Stanford. A idéia do manifesto saiu de um seminário promovido pela "Nature" e pela Universidade Rockefeller, de Nova York.
Além da Ritalina, os pesquisadores mencionam outras três drogas que já vêm ganhando algum grau de popularidade em usos "off label". Uma delas é a similar Adderall, também usada em transtorno de TDAH. Outra é a Stavigile (modafinil), aprovada para tratar o desgaste físico causado pela narcolepsia, mas que vem sendo usada por alguns estudantes para combater sono e cansaço.
Há ainda uma quarta droga, a Aricept, mais difícil de obter, originalmente aprovada para tratamento do mal de Alzheimer. A preocupação inicial dos cientistas, contudo, é mesmo a Ritalina. "Com a prevalência de TDAH indo de 4% a 7% entre universitários americanos (...), há um bocado de droga no campus que pode ser desviada para usos de aprimoramento."

Concorrência desleal
Caso o uso de drogas para "turbinar" o cérebro venha realmente a ser aprovado, há outras questões que devem ser discutidas, além da segurança, afirma o manifesto publicado na "Nature". Uma delas é o risco de que estudantes deixem de concorrer em pé de igualdade quando participarem de exames que envolvam inteligência.
Uma pessoa que tenha se valido de uma droga poderia obter vantagem de maneira artificial, da mesma forma que um atleta dopado faz na disputa de uma competição, por exemplo. Os cientistas apontam também o risco de mais um problema: empresários poderiam obrigar seus funcionários -de maneira direta ou indireta- a fazerem uso dessas drogas para melhorarem o rendimento.
O manifesto reconhece, porém, que faltam ainda muitos dados essenciais para que a discussão tome o rumo desejado. Ninguém sabe dizer, por exemplo, o quanto uma droga como a Ritalina pode de fato ajudar a inteligência propriamente dita. O efeito de longo prazo de uma dessas drogas sobre pessoas que já estão saudáveis, também, ainda é totalmente desconhecido.
"Clamamos por um programa de pesquisa sobre o uso e o impacto das drogas de aprimoramento cognitivo por indivíduos saudáveis", ressalta o documento. (RAFAEL GARCIA)

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

USP e Unesp adotam avaliação de professores

USP pagará prêmio de R$ 1.000 a servidores que tiveram bom desempenho
Bonificação leva em conta indicadores de desempenho da pós, o cumprimento de metas e a posição em rankings internacionais

JOSÉ ERNESTO CREDENDIO
FÁBIO TAKAHASHI
DA REPORTAGEM LOCAL

A USP e a Unesp, duas das principais universidades do país, decidiram criar programas de avaliação de seus servidores. Os sistemas prevêem pagamento de prêmios em dinheiro a professores e funcionários, no caso da USP, e uso de um sistema de pontuação para manutenção do regime de trabalho e do salário na Unesp.

O Prêmio Excelência Acadêmica Institucional USP terá o valor de R$ 1.000 nesta primeira edição -metade desse valor começa a ser pago hoje para professores e funcionários.
A segunda parcela do bônus será liberada no primeiro semestre do ano que vem. As próximas edições dependerão do orçamento da universidade.
Os critérios de avaliação levam em conta uma série de indicadores de desempenho, que inclui a avaliação da pós-graduação pela Capes -o prêmio só é pago caso sejam mantidas ou aumentadas as médias dos conceitos dos programas.
Outro item avaliado é o cumprimento dos planos de metas por todas as unidades.
O último deles leva em conta a posição ocupada pela USP em quatro rankings internacionais que testam centros de ensino (veja quadro nesta página).
Para fazer jus à premiação, a USP deve, a cada ano, estar entre as 200 melhores universidades do mundo em pelo menos duas dessas listas.
Uma comissão gestora do prêmio foi montada para avaliar o cumprimento das metas. Somente com o pessoal da ativa, a USP vai gastar na primeira edição cerca de R$ 21 milhões.
"A proposta do prêmio é reconhecer o esforço coletivo da comunidade acadêmica nessas conquistas, que conduzem à ampliação da liderança acadêmica da universidade, tanto no cenário nacional quanto no internacional", diz a reitora da USP, Suely Vilela, em nota.
A premiação é criticada pelo presidente da Adusp (Associação dos Docentes da USP), Otaviano Helene, que o vê como uma forma de não conceder aumentos salariais. "Se há dinheiro no orçamento, deve-se discutir reajustes salariais, colocar na mesa de negociações. Nem houve discussão formal", diz.

Unesp
Já a Unesp criou sistema em que o professor terá seu regime de trabalho reduzido, o que causa perda salarial, caso não atinja o patamar de produtividade fixado pela instituição.
Cada "recuo" no patamar de jornada pode significar perda superior à metade do salário -há três divisões, de 12, 24 e 40 horas de trabalho semanais.
Em uma escala de avaliação que vai de zero a cem pontos, o professor terá de atingir ao menos 50 (considerando a média de desempenho em três anos) para manter o regime de 40 horas semanais (grupo onde está a maioria dos profissionais).
Cada atividade docente ganhou uma pontuação. Exemplos: disciplina ministrada vale dois pontos; publicação de pesquisa em periódico reconhecido vale dez pontos. Será avaliada a produção do professor na graduação, na pós, na pesquisa, na extensão e na gestão.
"O docente precisa ter um desempenho mínimo, uma conduta acadêmica", afirmou o reitor Marcos Macari. "Lutamos quatro anos para aprovar o projeto. E estamos exigindo o mínimo do mínimo."
Simulação feita pela comissão que criou o sistema indicou que, se o modelo já estivesse em funcionamento, cerca de 10% dos docentes perderiam seus regimes de trabalho. A instituição possui 3.554 professores.
"Mas a redução não é automática. Se não atingir os pontos, o professor ainda terá direito a defesa", afirmou o coordenador da Comissão Permanente de Avaliação da universidade, Adriano Antonio Natale.
A avaliação começou neste ano. Ao final do período letivo, os docentes devem entregar as suas chefias os primeiros relatórios referentes à atividade anual, para o acompanhamento do desempenho trienal.
A Adunesp (associação dos professores) se mostra contrária à medida. Para a entidade, um dos principais problemas é adotar um único sistema de avaliação para todas as áreas.
O modelo, diz a Adunesp, pode obrigar que os docentes canalizem suas pesquisas apenas para áreas que tenham apoio e financiamento de empresas.
"Como o professor precisará apresentar uma produção, será mais fácil se ele trabalhar com áreas que recebem financiamento do mercado. Assim, você deixa de valorizar outras atividades", disse Antônio Luis de Andrade, diretor da entidade.
Andrade cita um exemplo: "Ao mercado, não interessa desenvolver medicamentos para doenças tropicais. Por isso, deixaremos de estudá-las?"
Fonte: FSP 04/12/08

Por causa de uns, a lei prejudica quem precisa, diz docente

BRUNA SANIELE
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Para a professora de artes da Escola Estadual Clodomiro Carneiro, Sandra Bárbara, as seis faltas são insuficientes. "Por causa de alguns, que se achavam no direito de faltar, a lei acabou prejudicando aqueles que precisam. Tive câncer de pele, é difícil sair de uma doença dessas. Em alguns meses tenho que me consultar com três especialistas e não posso abonar. Fiquei prejudicada", afirma Sandra.
Segundo ela, deveria haver um controle de faltas por meio de relatório médico. "Se fossem mais, ia ser bem melhor. Não precisava ser 12 como na prefeitura, mas podia aumentar um pouco", diz Samanta de Oliveira Barbosa, professora de educação básica.
Para a professora de português Patrícia Valéria Pereira, os professores com alta carga horária são os mais prejudicados. "Dependendo da carga horária que esse professor tenha, vão existir algumas faltas."
Conforme a diretora da Escola Estadual Clodomiro Carneiro, Helena Maria Aparecida Bittencourt, até o ano passado o número de faltas era alto devido aos atestados médicos.
"Alguns professores chegaram a tirar 15 faltas médicas em um mês. Quem estava saindo prejudicado era o aluno. Então conscientizamos os professores de que esses alunos não podiam ficar ociosos."
De acordo com a diretora, o trabalho de orientação incluiu reuniões, palestras e teleconferências -em 2008, a média da escola foi de duas faltas por professor.
"Dentro do que a lei manda, nunca houve muito problema. Quando o professor tem um compromisso com a escola, ele dificilmente falta. Assim você tem um aluno dentro da sala de aula", afirma Márcia Marques Quadros de Melo, professora de ciências.
A professora de matemática Ione Lopes dos Santos faz uma ressalva: "A freqüência melhorou, mas há pessoas que acabam vindo trabalhar mesmo doentes".
Fonte: FSP 04/12/08

Não constumo colocar comentários na própria matéria, mas achei que esta necessitava de um. A matéria deveria ter o título de: Lei obriga professor a trabalhar doente!
É impossível se limitar o número de dias a que um trabalhador, de qualquer categoria, possa faltar para tratamento de saúde. Pensando que, com os baixos salários pagos, professores precisam trabalhar nos três turnos (manhã, tarde e noite), em que momento ele fará seus acompanhamentos médicos ou tratamentos de saúde?
Alecxandra M Ito

Caem pela metade as faltas de docentes por atestado médico

Redução na rede estadual de SP ocorre após lei limitar a 6 por ano as ausências por doença
Antes, professores podiam faltar até metade do ano letivo sem desconto, desde que ausências fossem em dias alternados e com atestado


FÁBIO TAKAHASHI
DA REPORTAGEM LOCAL
O número de faltas de professores justificadas por meio de atestados médicos caiu 59% na rede estadual de SP. A redução ocorreu após a gestão Serra (PSDB) aprovar lei que limitou em seis a quantidade dessas ausências aos servidores por ano.
O balanço, feito pela Secretaria da Educação, comparou os seis meses posteriores à implementação da regra (em abril) com o mesmo período de 2007.
No ano passado, de maio a outubro, foram registradas 398 mil faltas justificadas com atestados de consultas ou exames. Em 2008, no mesmo período, foram 163 mil. A rede tem 230 mil docentes. O governo propôs a lei alegando que muitas faltas ocorriam sem necessidade.
Por meio da assessoria, a secretária Maria Helena Guimarães disse que a queda nas ausências dos docentes "reflete diretamente na aprendizagem dos estudantes, pois é fundamental que o professor acompanhe o dia-a-dia dos alunos".
Antes da lei, os servidores podiam faltar até metade do ano letivo sem desconto dos dias perdidos, desde que as ausências fossem em dias alternados e com atestado médico para comprovar consultas ou exames. Para licenças médicas ou ausências em dias seguidos por problemas de saúde, era preciso passar por perícia (regra que continua em vigor).
Reportagem da Folha de novembro de 2007 mostrou que, diariamente, cerca de 30 mil professores faltavam às aulas, por várias razões. A secretaria diz que não fechou o balanço geral atualizado das ausências.
Além da nova norma, o governo tomou outras medidas na tentativa de diminuir o absenteísmo, como investigar os atestados e usar o número de faltas como um dos critérios para pagamento de bônus.
A presidente da Apeoesp (sindicato dos professores), Maria Izabel Azevedo Noronha, afirmou que não confia nos dados apresentados. "Não acho que o absenteísmo seja tão alto." Ela disse também que "o governo não tenta combater as reais causas das faltas dos professores, que são as condições de trabalho e os salários".
Professora da Faculdade de Educação da USP, Lisete Regina Gomes Arelaro diz que "a secretaria parte do princípio de que a população não adoece. Aposto que a secretária e sua equipe vão mais de seis vezes ao médico por ano". Para ela, "o governo adota métodos coercivos para evitar faltas, com prejuízos financeiros. Como os salários são baixos, os professores trabalham até doentes".
Avaliação oposta tem a diretora-executiva da Fundação Lemann, Ilona Becskeházy, instituição que possui programas para melhorar a gestão de escolas públicas no país. "Todo mundo sabia que o abuso era gigantesco. Por anos, como o governo não podia dar aumento, passou a permitir as faltas. A lei veio para moralizar."
A Secretaria Municipal de Educação de São Paulo também registrou queda nas faltas. Entre 2006 e 2008, o número de ausências recuou 54,3%.
A gestão Gilberto Kassab (DEM) cita três explicações: os atestados agora só podem ser emitidos pela prefeitura, e não mais por médicos particulares; a falta em cada aula é descontada; e o aumento do peso das ausências como critério para pagamento de gratificações.
Fonte: FSP 04/12/08

Esta e a reportagem postada na seqüência são complementares. O governo aponta a lei como algo a ser glorificado, por poupar recursos financeiros, em tese. Não houve uma discussão aprofundada da razão pela qual as pessoas precisam de tantos atestados de saúde e por qual motivo os professores vêm adoecendo, muitas vezes em silêncio. Muitos professores evitavam os afastamentos com medo de perderem pontos (ranking que permite a escolha de escolas e número de aulas), e assim iam trabalhando doentes, com dores, sem voz, etc. Com a lei o que se fez foi institucionalizar que essa deve ser a prática: trabalhe doente! A lei sozinha não irá melhorar a qualidade da educação pública, mas pode, ao contrário, conquistar trabalhadores mais descontentes e em condições de saúde precárias. Alecxandra M Ito

Crise em universidade afeta 4 hospitais no Rio Grande do Sul

Bloqueio das contas bancárias faz Ulbra atrasar salários de seus funcionários

GRACILIANO ROCHA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM PORTO ALEGRE

Atrasos nos salários de funcionários da Ulbra (Universidade Luterana do Brasil) deixaram em situação crítica quatro hospitais geridos pela instituição no Rio Grande do Sul. O atendimento está restrito a emergências, cirurgias eletivas foram canceladas e UTIs estão se esvaziando à medida que os pacientes são transferidos.
"Pode haver um colapso. O número de pacientes atendidos diminuiu e as cirurgias estão sendo remarcadas para o dia de "São Nunca". Os médicos ainda não receberam os meses de setembro e outubro", relata Paulo Argolo, presidente do Sindicato dos Médicos do Rio Grande do Sul.
Pelas contas do sindicato, só estão ocupados 15% dos 500 leitos que a Ulbra tem em dois hospitais de Porto Alegre, um em Canoas (região metropolitana) e outro em Tramandaí (litoral norte). A Ulbra não divulgou os dados, mas a estimativa dos médicos é que pelo menos mil pessoas deixem de receber atendimento diariamente pelo SUS (Sistema Único de Saúde).
A crise nos hospitais, que se tornou mais aguda nos últimos dez dias, é resultado de sucessivos problemas de caixa, que começaram em agosto, depois que houve bloqueio das contas bancárias da Ulbra para pagamento de dívidas com a União e com fornecedores.
O maior débito da Celsp (Comunidade Evangélica Luterana São Paulo), mantenedora da universidade, é com a Receita Federal -cerca de R$ 2 bilhões em impostos atrasados. A dívida está sendo contestada.
Sem dinheiro para honrar os compromissos, parte dos funcionários parou de trabalhar e os pagamentos de salários estão saindo graças a ações judiciais movidas por sindicatos.
Ontem, a governadora Yeda Crusius (PSDB) prometeu aos médicos recursos para manter os hospitais funcionando.
"Estamos buscando uma solução compartilhada, com recursos do Estado e das prefeituras. Estamos fazendo isso em Tramandaí, hospital onde a demanda cresce muito no verão", disse ontem o secretário estadual da Saúde, Osmar Terra.
O secretário deve se reunir com o reitor da instituição, Ruben Becker, para discutir a situação dos outros hospitais.
Becker não atendeu ao pedido de entrevista da Folha. Sua assessoria informou que ele "não concede entrevistas". A universidade informou que os pró-reitores não responderiam a perguntas sobre a crise.
Fonte: FSP 04/12/08

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

SP tem mais serviço social em bairros ricos, diz estudo

Os dez distritos com as redes de proteção mais frágeis estão nas periferias e em lugares de pobreza extrema
Bruno Paes Manso, de O Estado de S. Paulo
SÃO PAULO - Os dez distritos da cidade que oferecem mais vagas em programas sociais e educacionais para crianças e adolescentes estão nas regiões centrais e mais bem estruturadas de São Paulo. Já os dez distritos com as mais frágeis redes de proteção ficam nas periferias e concentram número elevado de crianças e jovens em condição de pobreza extrema. O ranking dos serviços no Município, obtido com exclusividade pelo Estado, foi encomendado ao Instituto Lidas pelo Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA).

Em primeiro lugar no ranking de atendimento ficou Moema, na zona sul. Entre os mais de 70 mil moradores da área, 53% vivem em famílias cujo chefe ganha mais de 20 salários mínimos por mês, situação que se reflete nos indicadores sociais do bairro. Perto de 70% da população teve mais de 12 anos de estudos. Das meninas com idade entre 10 e 19 anos, apenas 1,73% enfrentaram problemas de gravidez na adolescência. A taxa de homicídios no bairro, em 2006, foi de 1,5 caso por 100 mil habitantes, semelhante à de países desenvolvidos. Para cada mil crianças e adolescentes do bairro até 18 anos, 564 dispõem de vagas em diferentes serviços conduzidos pela Prefeitura e por entidades do terceiro setor - passando por vagas em creche, apoio socioeducativo, orientação sócio-familiar e medidas socioeducativas.
Os dez primeiros distritos no ranking, todos com mais de 285 vagas ofertadas para cada mil crianças e jovens de até 18 anos que vivem na região, possuem 1,5% de seus jovens em situação de pobreza extrema (seguindo os índices de vulnerabilidade social da Fundação Seade). Para se ter uma idéia da elevada concentração de serviços nessas áreas, toda a capital oferece, em média, 89 vagas para cada mil pessoas até 18 anos, enquanto 17% de seus jovens vivem em pobreza extrema.A situação se inverte em Perus, o último colocado entre os 96 distritos, que tem dez vagas em diferentes tipos de serviços para cada mil moradores de até 18 anos ou 56 vezes menos do que o distrito de Moema. Ao mesmo tempo, 11% de seus jovens estão em situação de extrema pobreza. Em 2006, por exemplo, o índice de homicídios na região alcançou 31 casos por 100 mil habitantes, total 21 vezes maior do que em Moema. No mesmo ano, 17% das mulheres no distrito com idade entre 10 e 19 anos engravidaram. A situação se repete entre os dez piores colocados do ranking, que chegam a oferecer no máximo 24 vagas de serviços sociais e educacionais para cada grupo de mil com idades até 18 anos. Ao mesmo tempo, em média 12% de seus jovens estão em situação de pobreza extrema.
E o ranking traz surpresas. O Brás, na região central, é o quarto distrito com menor oferta de vagas, com um índice de 14 vagas para cada mil jovens do bairro. Como é vizinho de distritos com alta oferta, como Belém e Água Rasa, ambos entre os 20 mais bem colocados, a carência de serviços acaba sendo amenizada.Já o distrito do Grajaú, na periferia sul, com 76 vagas por cada mil pessoas de até 18 anos, fica um pouco abaixo da média registrada na capital. A situação piora quando se constata que mais de 42 mil crianças e jovens vivem em situação de pobreza extrema, o que representa 32% da população até 18 anos. "Ainda não tínhamos um quadro dos serviços na cidade e o estudo ajuda a detectarmos as distorções", afirma a presidente do CMDCA, Elaine Macena Ramos. "Com esse quadro, temos como ajudar a orientar investimentos do poder público e do terceiro setor e como cobrar melhorias para as populações menos beneficiadas."
Fonte: Estado de São Paulo 3/11/2008

A escola que não pára em pé

Infra-estrutura educacional brasileira é muito precária e incide negativamente no processo de ensino-aprendizagem; cerca de cinco mil escolas não contam sequer com luz elétrica
Paulo de Camargo
O Brasil é indiscutivelmente um país de contrastes. No momento em que almeja um salto na qualidade de ensino, planeja informatizar todas as escolas até 2010 e investe na formação e na capacitação de professores, cinco mil das 168,2 mil escolas de Educação Básica não possuem acesso a luz elétrica e outras duas mil passam sem água potável.
"As condições estruturais dos prédios escolares é lamentável. Temos escola com infiltração, sem luz, com janelas quebradas, muros caídos, sem laboratórios ou bibliotecas", ataca o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Roberto Franklin de Leão. O que poderia ser um discurso mais ácido de um líder de categoria reflete, na verdade, o que uma série de pesquisas realizadas ao longo de 2008 vem acusando. Se os romanos ensinaram há séculos que uma mente sadia precisa de um corpo são, as escolas brasileiras também precisam cuidar do próprio esqueleto, se não quiserem que a busca de melhores resultados acadêmicos esbarre nas limitações estruturais.
Um estudo internacional revelador foi publicado neste ano pela Unesco. Denominada Um olhar para o interior das escolas primárias, a pesquisa comparou dados de diversos países, entre eles os relacionados às condições de ensino. Segundo o informe, em quase 12% das escolas não há lugares suficientes para os alunos se sentarem. O estudo diz textualmente que, no Brasil, praticamente 50% das crianças do 1º ao 5º ano que estudam em escolas da zona rural e quase 25% das escolas urbanas têm aulas em edificações consideradas ruins. Outros 5,5% ficam em escolas que não têm luz. Em um país com quase 56 milhões de matrículas na Educação Básica, sendo 33,2 milhões no ensino fundamental, nenhuma porcentagem é desprezível.
Básico do básico
Qualquer que seja o ângulo pelo qual se olhe, as escolas brasileiras sofrem, em diferentes graus, pelo abandono. Basta uma consulta ao sistema de dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) para descobrir que 11.088 estabelecimentos de ensino fundamental simplesmente carecem de sanitário. Dados como esse incomodam, cada vez mais, os educadores. Outro estudo de 2008, desta vez realizado pela Organização dos Estados Ibero-americanos (OEI) e Fundação SM, mostrou que cerca de metade dos professores brasileiros estão insatisfeitos com as instalações, equipamentos e materiais com os quais a escola conta, bem como com o pessoal de suporte. "Não precisaríamos nem estar conversando sobre esse tema; uma escola necessariamente precisa ter luz, água, biblioteca operante", critica a pesquisadora Maria Malta, da Fundação Carlos Chagas e presidente da ONG Ação Educativa. "Trata-se antes de tudo de uma questão de dignidade humana", diz.
É um abacaxi difícil de descascar, pois envolve muitas dimensões diferentes. Pode-se pensar na infra-estrutura predial. A maior parte das escolas brasileiras foi construída nas décadas de 70 e 80, e assim chegam aos 30 anos de uso contínuo e desgastante. Isso faz com que muitas sequer tenham uma malha elétrica com capacidade suficiente para, por exemplo, receber computadores. Para onde se olha, há necessidade de investimentos, como é o caso da falta de acessibilidade para portadores de deficiências. Segundo a Unesco, em quase 95% da rede pública não há rampas ou vias de acesso para alunos e professores com mobilidade reduzida.
A falta de cuidados necessários com a infra-estrutura da escola é produto de um histórico descaso - que gerou as famosas escolas de lata, em São Paulo, eliminadas apenas neste ano -, mas também deriva de distorções, como a valorização absoluta da responsabilidade do professor, em detrimento de suas condições de trabalho. Claro, ninguém em sã consciência discute ainda o papel decisivo do professor na qualidade de ensino. Contudo, muitos estudos realizados, por exemplo, nos Estados Unidos, chegaram a apresentar como inócuos investimentos em recursos materiais. Mas daí a desconsiderar a importância das condições físicas vai um longo passo.
Os estudos que defendem a importância menor dos aspectos materiais não levam em conta a realidade do contexto social em que vivem os alunos. "Uma coisa é você introduzir mais computadores em escolas organizadas, que já utilizam a tecnologia; outra muito diferente é colocar 10 micros em uma escola que não tinha nenhum", coloca o pesquisador Sergei Soares, do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea).
No início de 2008, Sergei empreen­deu, com a pesquisadora Natália Sátyro, uma investigação para tentar comprovar o impacto dos recursos de infra-estrutura na qualidade de ensino. Utilizando como índice de qualidade a defasagem idade-série e isolando diferentes fatores para a análise, a pesquisa concluiu que a infra-estrutura representa efetivamente um impacto forte. "Uma melhoria de infra-estrutura pode reduzir a defasagem idade-série em 5,7%", diz. Para escolas com grandes defasagens, essa redução pode ser bastante significativa. "Acho que se subestima imensamente, por exemplo, o impacto das bibliotecas, especialmente porque sempre se fala da existência ou não do espaço, mas nunca de como é utilizado", acredita Sergei Soares. A defasagem idade-série média no Brasil, com dados de 2006, é de 28,5% na 4a série, 33,8% na 8a série e 41,3% no ensino médio.
O caso das bibliotecas é mesmo emblemático. Afinal, desde a Antigüidade esses espaços vêm sendo reverenciados como lócus da cultura, da valorização do saber e do prazer em exercitar a imaginação e a curiosidade. Mas, segundo um estudo preparado em dezembro do ano passado pelo Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, hoje quase 18 milhões de alunos do ensino fundamental (53,9% do total) e quase 2,7 milhões de jovens (30,2%) do ensino médio simplesmente não têm acesso a bibliotecas. Pior, os dados não levam em conta milhares de escolas que possuem bibliotecas fechadas, por falta de pessoal.
O dilema rural
No contexto crítico da infra-estrutura, um setor merece especial atenção. Os piores indicadores se concentram nas chamadas escolas rurais. Segundo o Censo Escolas 2006, são quase 91,5 mil escolas de ensino fundamental e médio, municipais, estaduais e, em menor proporção, federais, espalhadas fora dos centros urbanos e concentrando mais de 13% dos alunos - ou 7,4 milhões de crianças e jovens, que estudam em condições bastante precárias. Basta ver que menos de 600 escolas rurais de ensino fundamental possuem laboratórios de ciências e apenas 5,6 mil contam com bibliotecas.
Não por acaso, o Brasil está entre os países da América Latina e Caribe que apresentam maiores diferenças de resultados entre os alunos de escolas urbanas e rurais, ao lado do Peru e do México, segundo um estudo realizado pela Unesco. "A questão rural é dramática", diz José Marcelino Rezende, da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, em Ribeirão Preto, e membro da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, movimento que articula diversas entidades não-governamentais com propostas de melhoria no ensino público.
Ex-diretor do Departamento de Disseminação de Informações Educacionais do Inep, Marcelino Rezende foi um dos idealizadores, com Denise Carreira, de um parâmetro de investimento em educação que vem dando o que falar. Trata-se do Custo-Aluno Qualidade Inicial (CAQi), uma fórmula de cálculo do custo por aluno que parte não do que é efetivamente gasto, mas do que seria necessário investir para oferecer aos estudantes condições mínimas de aprendizagem.
O índice foi construído ao longo de cinco anos, por dezenas de educadores, a partir das demandas das escolas e, principalmente, do que já está proposto no Plano Nacional de Educação, a Lei 10.172, aprovada em 2001. Recebida como uma conquista da sociedade civil, a lei tarda a sair do papel. Completa e detalhada, prevê até que as escolas devem ter máquinas xerográficas, entre outros equipamentos.
A partir dessas referências, os pesquisadores identificaram o que seria o "kit básico" de operação de uma escola - como quadras esportivas cobertas, salas de professores, laboratório de informática, de ciências, biblioteca com bibliotecário, entre outros itens -, bem como a remuneração mínima de professores e recursos para investimento em projetos de caráter pedagógico, como feiras de ciências, hortas, saídas de estudo do meio, entre outros itens. "Não se trata de condições ideais, mas mínimas", ressalta Rezende.
O resultado dessa conta não chega a impressionar. Em síntese, sugere que as diversas instâncias do poder público deveriam dobrar o gasto por aluno. Enquanto o mínimo previsto pelo Fundeb foi de R$ 946 por aluno em 2007, pelo CAQi esse valor passaria a ser de R$ 1.876 por aluno-ano, não considerando as despesas com alimentação escolar. As maiores diferenças se dão justamente nas áreas mais carentes. Para Marcelino Rezende, cada aluno das escolas rurais deveria custar ao governo perto de R$ 2,3 mil, valor que possibilitaria a recuperação da infra-estrutura e salários diferenciados para professores que se dispusessem a trabalhar em regiões mais distantes.
Depois de criar o índice, o passo seguinte vem sendo tentar convencer as autoridades a aceitar o indicador como um parâmetro de investimento. Um passo importante foi dado no final de setembro, quando o Conselho Nacional de Educação aceitou discutir o índice para, posteriormente, indicá-lo como referência para o financiamento da educação pública.
Mãos à obra
Em meio a esse cenário de decadência, uma boa novidade está em curso na administração pública brasileira. Governo federal, estados e municípios parecem estar, enfim, despertando para a urgência do problema.
No caso do Ministério da Educação, por exemplo, foi retomado um processo denominado LSE (Levantamento da Situação da Escola). Conforme Romeu Caputo, diretor de articulação e apoio aos sistemas do MEC, hoje há perto de 1.000 técnicos e engenheiros das universidades e escolas técnicas federais visitando escolas em todo o país para averiguar o estado físico dos prédios, escrever laudos e elaborar projetos de reforma. Telhados, esquadrias, piso, carteiras, cantinas, enfim, todos os itens vêm sendo analisados. Ainda não há um balanço das vistorias, mas até o final do ano, Caputo espera que todos os dados sobre as demandas das escolas possam ser consultados on-line por qualquer cidadão.
Nos dois últimos anos, o MEC liberou R$ 2 bilhões para infra-estrutura. Está previsto um aumento de investimento, que depende do balanço do LSE. "Sabemos de antemão que boa parte das escolas precisa de melhorias", diz Caputo. Afinal, as escolas estão entre os equipamentos sociais que mais sofrem desgaste pelo uso, pois é um espaço utilizado por centenas de crianças, jovens e adultos, por até 18 horas por dia, e com pouco pessoal de manutenção. "Imagine o que acontece com uma carteira utilizada por 15 horas diárias, ao longo de anos", diz.
"A garantia das condições de aprendizagem passa pelo espaço da escola", ressalta a diretora do MEC e ex-presidente da União dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), Cleuza Repulho. A boa nova, acredita, é que a preocupação das prefeituras com o tema tem aumentado, inclusive para adaptar a escola aos portadores de deficiência. Outro movimento que já se iniciou é a construção de escolas de educação infantil, onde há uma grande demanda sem cobertura.
Preocupação semelhante se verifica no Estado de São Paulo, onde foi criado, em maio, um sistema de manutenção escolar denominado "Sempre", para tornar mais ágil a contratação de empresas para obras escolares. Num processo denominado "Ata de preço", as empreiteiras são pré-contratadas e ficam à espera de ordens de serviço. "Temos já preço para muro, telhado, hidráulica, elétrica, para que não haja atraso", diz a secretária de Estado da Educação, Maria Helena Guimarães Castro.
Embora não haja discordância sobre a necessidade de se reestruturar o sucateado parque de escolas públicas, os especialistas concordam que é preciso ir mais longe. A escola ainda padece da falta de recursos humanos, reduzida a uma estrutura que na maior parte das vezes se restringe a um diretor, um vice-diretor, professores e alunos. Isso faz, segundo as entidades sindicais, com que os diretores se desdobrem em funções administrativas. No site do Sindicato dos Especialistas em Educação do Magistério Oficial do Estado de São Paulo (Udemo), os três primeiros itens de um decálogo de instruções de pressão contra as deficiências da infra-estrutura relacionam-se à falta de merendeira, de secretários e de bibliotecários. "Tem diretor que faz merenda, trabalho de secretaria, preen­che papéis, tudo menos acompanhar o processo pedagógico", reclama o presidente da entidade, Luiz Gonzaga de Oliveira Pinto.
"A literatura é clara para mostrar que profissionais de apoio são importantes. A pior filosofia que se pode defender na escola é a de Pero Vaz de Caminha, segundo a qual 'em se plantando, tudo dá"', argumenta o pesquisador do Ipea Sergei Soares. "Ou seja, não basta jogar o professor e os alunos dentro da sala de aula e esperar que tudo dê certo", conclui.
Para Cleuza Repulho, do MEC, as escolas brasileiras ainda precisam amadurecer a discussão sobre o quadro mínimo que a escola precisa ter para atender aos seus objetivos. "Não se discute a questão de que a escola precisa de mais gente, mas é preciso saber quem", diz. Segundo ela, o MEC é indutor de políticas, e não pode interferir nas definições de estados e municípios. As redes pretendem fazer novas contratações para os quadros escolares, mas em muitos lugares esbarram na lei de responsabilidade fiscal.
Gente, gênero de primeira necessidadeSegundo a pesquisadora Elena Martin, diretora-geral do Ministério da Educação da Espanha entre 1985 e 1996, as escolas públicas espanholas possuem quadros que incluem, além do diretor, um chefe de estudos, orientador pedagógico, professores de apoio para o trabalho com alunos portadores de deficiências ou com dificuldades de aprendizagem. Além disso, em geral, as escolas possuem uma oficina para realizar os reparos urgentes para manter a boa conservação. No quadro de pessoal, segundo Elena, as escolas possuem também o que chamam de "cuidador", ou seja, um funcionário dedicado especialmente a ajudar as pessoas com mobilidade reduzida, a ter acesso a todos os espaços escolares.
No caso brasileiro, as escolas ainda lutam com problemas como a reposição de professores faltosos e a rotatividade de profissionais. Esse é um dos males antigos que ainda provocam estragos no processo de aprendizagem. Um estudo sobre infra-estrutura recente realizado pelas pesquisadoras Roberta Loboda Biondi e Fabiana de Felício, no Inep, comparou o desempenho dos alunos no Saeb ao longo de quatro anos, e mostrou que as turmas de 4ª série e de 8ª série que não sofreram com a troca de professores ficaram em uma vantagem equivalente a três meses a mais de estudo, em relação a colegas de escolas com alta rotatividade de docentes.
Não é apenas no quadro pedagógico que há lacunas a serem preenchidas. "Temos uma estrutura capenga, os módulos são incompletos e faltam inspetores de alunos, bem como funcionários para a higiene e manutenção, o que cria uma situação muito difícil", reclama Roberto Leão, da CNTE. Segundo o dirigente, a sociedade não percebeu, mas as reivindicações dos professores deixaram de ser voltadas para o aspecto salarial. "Hoje, temos de lutar pela melhoria das condições de funcionamento do ponto de vista da infra-estrutura, do número de pessoas que são necessárias para tocar uma escola e da melhoria geral das condições de trabalho", finaliza.


Fonte: REVISTA EDUCAÇÃO - EDIÇÃO 139