terça-feira, 16 de dezembro de 2008

INCLUSÃO EM CENA Especial da Folha

Deficiente mental ganha 48% menos que os demais
Eles representam 2,4% do total de empregados com deficiência no país
CRIPPA COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Prestes a concluir o ensino médio, Tamara Regina de Souza, 21, começou a procurar emprego em escritórios e lojas de departamentos. Passou quase três anos entre testes e entrevistas sem nada conseguir até que uma tia desconfiou de seu desempenho -inferior ao de outras garotas da mesma idade. Levada ao médico, soube que tinha deficiência intelectual leve, conseqüência de ataques epilépticos que sofria desde os sete anos. "Sempre tive dificuldade na escola", comenta. A oportunidade de trabalho só surgiu três anos mais tarde, após freqüentar cursos de capacitação para deficientes. Em fevereiro, começou a trabalhar em uma maternidade, onde confere as guias das pacientes.Ainda que tenha passado por uma via-crúcis para conseguir a colocação, Souza é exceção entre os deficientes intelectuais.Dados do Censo 2000, apurados pelo IBGE (Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), demonstram que 14,5% da população tem algum tipo de deficiência -8,3% são deficientes mentais.
Mas, de acordo com a Rais 2007, do Ministério do Trabalho e Emprego, apenas 2,4% do total de pessoas com necessidade especial empregadas têm deficiência mental. Os deficientes físicos representam 50,3%, e os auditivos, 28,2%.
A discriminação é refletida também nos níveis salariais. Em média, um deficiente intelectual ganha R$ 728 mensais, enquanto a remuneração média dos profissionais deficientes, em geral, é de R$ 1.390 por mês -diferença de 91%.No caso das pessoas com deficiência auditiva, esse valor é de R$ 1.845; no de visuais, R$ 1.413. Segundo a Rais 2007, a média salarial de brasileiros não-deficientes é de R$ 1.356.Dados da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de São Paulo apontam que, de 2001 a julho de 2008, 85.524 pessoas entraram nas empresas por meio da Lei de Cotas. Desse universo, apenas 3.250, ou 4%, são deficientes mentais.
Adaptação
A justificativa de especialistas ouvidos pela Folha é que contratar um deficiente mental requer mais adequações."É um trabalhador que exige mais treinamento, mais prazo para dar retorno e um acompanhamento constante", afirma a psicóloga Maria Aparecida Fernandes Pereira, coordenadora do Programa de Formação Profissional Conte Comigo da Apae (Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais).
Listado como uma das empresas que mais contratam deficientes no Brasil, o Itaú emprega hoje 2.600 funcionários nessas condições -nenhum com deficiência intelectual."Para 2009, queremos não só os incluir mas também criar uma condição de carreira, sem conceito paternalista", adianta Ana Paula Lima, superintendente da área de atração, diversidade e integração do banco.
Deficientes qualificados são maioria no mercado
Dos empregados com deficiência, 53% têm nível médio ou superior
MARIA CAROLINA NOMURA
DA REPORTAGEM LOCAL
Ter qualificação é a exigência mínima para ocupar qualquer posto de trabalho. Para pessoas com deficiência, essa regra não é diferente.De acordo com dados da Rais 2007 (Relação Anual de Informações Sociais, do Ministério do Trabalho e Emprego), das 348.818 pessoas com deficiência inseridas no mercado profissional, 53% têm o ensino médio ou o superior completo."Isso reflete o viés de contratação das empresas, que estão priorizando recrutar pessoas [com deficiência] com nível de escolaridade maior", explica José Carlos do Carmo, um dos coordenadores do programa de inclusão da pessoa com deficiência da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Estado de São Paulo.Investir na educação para se destacar no mercado de trabalho foi a aposta do professor de artes plásticas do Colégio Santa Maria, Paulo Pitombo, 49, deficiente visual."O mercado é muito exigente e tentei me qualificar ao máximo. Além da competência, tive que mostrar credibilidade", conta ele, que tem mestrado pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).
Excluídos
A realidade da inclusão, contudo, não é otimista, na avaliação do assessor da Secretaria de Inspeção do Trabalho Rogério Reis. "As empresas optam por contratar pessoas com deficiências mais leves. O número total de trabalhadores poderia ser dobrado se a cota estivesse sendo cumprida", afirma. Pela Lei de Cotas, companhias com mais de cem funcionários têm de reservar de 1% a 5% de vagas para deficientes, conforme o número de colaboradores. No Brasil, o Censo 2000, do IBGE (Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), aponta que 14,5% da população -24,5 milhões de pessoas- tem alguma deficiência. falta de fiscalização, diz Reis, é um dos grandes entraves para o cumprimento da norma. "As empresas ainda alegam que os profissionais não são qualificados nem capacitados."A fim de driblar essa situação, o Ministério do Trabalho e Emprego lançou, em novembro, um projeto piloto em nove Estados para incitar a inclusão. O objetivo é oferecer à empresa a alternativa de capacitar as pessoas com deficiência como aprendizes durante dois anos. "Após esse período, ela terá de contratá-los pela cota."
Fonte: FSP 14/12/08
Comentário: Alega-se que a baixa qualificação é o que impede a contratação de muitos deficientes. Com as políticas de Educação Inclusiva do Governo Federal isto vem caíndo por terra e vai ficando mais evidente que se trata da procura de um funcionário que se enquadre em um determinado padrão. Não se pensa em reestruturação da empresa para que ela seja inclusiva, pois a reenstruturação visa apenas aos lucros e o investimento em pessoas com deficiência, no início, pode gerar algumas despesas, que serão compensada a longo prazo. Da mesma forma, nada justifica o baixo salário de pessoas "classificadas" muitas vezes indevidamente, como pessoas com deficiência intelectual. Novamente é a tentativa de enquadra o empregado na empresa e não a empresa às demandas sociais, das quais ela depende e é sustentada. Lembra a mesma discussão sobre produção sustentável, com as mesmas alegações que hoje se mostram grandes engodos.