segunda-feira, 30 de março de 2009

Ensino de imigrantes tenta equilibrar educação e adaptação - 30/03/2009

Fonte: The New York Times / Folha de São Paulo

Ensino de imigrantes tenta equilibrar educação e adaptação

Por GINGER THOMPSON
WOODBRIDGE, Virgínia - Nos corredores do colégio de ensino médio Cecil D. Hylton High, num subúrbio de Washington, é difícil detectar algum sinal das divisões que no passado pareciam ser um fator imutável na sociedade americana.
Duas garotas andam de braços dados; uma é muçulmana e usa lenço na cabeça, outra é uma loira de jeans justo. Um rapaz hispânico vestindo uma camiseta com uma estampa de Barack Obama cumprimenta um aluno negro de penteado afro. O presidente do corpo discente, filho de refugiados do Laos, pendura folhetos sobre uma feira de doces.
À medida que as divisões antigas desaparecem, porém, ondas de imigração vêm alimentando divisões novas entre os estudantes que falam inglês e os que ainda estão aprendendo a língua. "Sinto-me grata a meus professores pelo pouco de inglês que consigo falar", disse a guatemalteca Amalia Raymundo durante um intervalo. Mas, acrescentou, "sinto que eles me freiam ao me isolarem".
Sua melhor amiga, Jhosselin Guevara, também da Guatemala, opinou: "Talvez os professores estejam querendo nos proteger. Há gente que não nos quer aqui". Nos últimos dez anos, o número recorde de imigrantes, legais e ilegais, tem estimulado o maior crescimento em décadas nas escolas públicas dos EUA. O fluxo impõe pressões aos orçamentos de muitos distritos escolares, colocando as salas de aula na linha de frente da batalha americana em relação a se e como assimilar os recém-chegados ao país e seus filhos. Dentro das escolas, que têm que aceitar a matrícula de alunos independentemente de seu status migratório, a discussão gira em torno de como melhor educá-los.
A Hylton High é um laboratório. Como milhares de outras escolas nos EUA, ela reagiu ao aumento no número de imigrantes, canalizando-os para uma escola dentro da escola. Trata-se, na prática, de uma forma contemporânea de segregação que garante aos alunos que estão aprendendo inglês um apoio intensivo para satisfazerem os padrões acadêmicos crescentes, além de ajudar a conservar a paz.
Num país em que a maioria dos estudantes iniciantes no inglês está atrasada em relação aos demais segundo quase todos os critérios, o programa da Hylton se destaca pelas notas altas de seus alunos em exames e o alto índice dos que concluem o curso. Contudo, numa época de turbulências sociais, essas conquistas carregam custos consideráveis.
A calma nos corredores do colégio esconde os ressentimentos que fervilham entre alunos que mal se conhecem. Eles não hesitam em tachar uns aos outros de "estúpidos" ou "racistas". Já houve ocasiões em que as tensões levaram a brigas, incluindo uma em que estudantes imigrantes arrancaram uma bandeira americana da parede e alunos negros responderam gritando "voltem para seu país!".
O corpo docente de Hylton diverge quanto a como educar sua população estrangeira. Alguns dizem que os imigrantes são injustamente "mimados" e deveriam ser obrigados a entrar para a grande massa de estudantes em menos tempo. E mesmo os professores que defendem a segregação de alunos questionam se o programa atende às necessidades da escola, mas às expensas dos estudantes, que ganham pouca exposição ao tipo de disciplina e experiência que lhes prepararia para ascender na sociedade americana.
"É difícil para nós", disse a diretora do colégio, Carolyn Custard. "Não estou plenamente convencida de que estejamos fazendo a coisa certa. Não quero que os alunos fiquem separados, mas, ao mesmo tempo, quero que eles deem certo." Segundo as autoridades de ensino, há cerca de 5,1 milhões de estudantes nos EUA -ou seja, 1 em cada 10 matriculados nas escolas públicas- aprendendo o inglês. É um aumento de 60% em relação ao período de 1995 a 2005.
Os pesquisadores oferecem muitas explicações para as divisões entre esses estudantes e os outros grupos. O mais paradoxal, dizem, é que um país que se orgulha de ser um caldeirão cultural ainda não chegou a um consenso quanto à melhor maneira de ensinar os imigrantes. O programa do colégio Hylton para iniciantes no inglês -dirigido por Ginette Cain, 61- é um grupo sobretudo latino que inclui alunos de 32 países, falantes de 25 línguas. Especialistas estimam que o aluno médio que está aprendendo o inglês precisa de ao menos dois anos de estudo para poder conversar e entre 5 e 7 anos para escrever redações, compreender um romance ou explicar processos científicos no mesmo nível que seus pares anglófonos.
Última parada entre a adolescência e a idade adulta, os colégios de ensino médio não podem contar com tanto tempo. Para levar os alunos a se graduarem, é preciso que recuperem o atraso, competindo com colegas que estão 15 anos à sua frente. Quanto mais Amalia Raymundo, 19, vai ao colégio, mais ela sente que suas opções diminuem. Na aldeia rural em que vivia na Guatemala, ela era uma estrela em ascensão, vencedora de concursos de beleza regionais e candidata a bolsas de estudo para a universidade. Mas ela chegou aos EUA dois anos atrás para conhecer sua mãe, que não via desde que era bebê, e com a ideia de que uma educação americana a ajudaria a realizar seu sonho de "virar alguém na vida".
Ela se esforça muito para tirar boas notas. Neste ano, porém, começou a se perguntar se tanto trabalho vale realmente a pena. Quase abandonou o colégio. Todas as aulas a que Amalia assiste são dadas em inglês. Mas a guatemalteca teme que, por passar a maior parte do dia falando espanhol com os colegas de escola e com seus pais, vá levar anos para obter fluência em inglês suficiente para poder competir por uma vaga universitária.
Isso significa que, até agora, ela tem tido pouco acesso a colaboradores e redes que poderiam ensiná-la a mover-se melhor em seu novo país, a criar sua página própria no MySpace ou a conduzir um carro. "Se eu vou acabar sendo faxineira como a minha mãe, para que estudar?", disse Amalia. O programa do Hylton, conhecido formalmente como Inglês para os Faladores de Outras Línguas, ou Esol, virou motivo de orgulho por ajudar estudantes imigrantes a se saíram bem nos estudos, mas também alvo de críticas de que as aulas segregadas prejudicariam os alunos por isolá-los e simplificar o currículo.
Peter Bedford, professor de história que é a favor do programa, explica: "Os colégios precisam fazer uma escolha pragmática: concentrar-se em ensinar os alunos ou em promover sua integração social?" "Esta escola fez a escolha de focar o ensino", disse ele. "As melhores ferramentas que podem dar a eles para que funcionem bem na sociedade são seus diplomas."
Mas a diretora-assistente Amy Weiler receia que o programa tenha convertido o colégio de ensino médio em um fim, em vez de um começo. "Nosso programa é bem-sucedido em levar nossos alunos a passar em exames", disse Weiler. "Mas, se você quer saber se estamos ajudando nossos alunos a serem assimilados, não temos dados para responder. Meu medo é que, se formos ver onde os alunos do Esol estarão em dez anos, vamos nos decepcionar."
Amalia Raymundo sonhava ser médica, mas aprendeu a adaptar suas metas. "Quando vim para este país, eu tinha a mala cheia de sonhos", disse ela. "Agora vejo que meus sonhos são limitados."