segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Ecstasy enreda jovens da elite brasileira

 

Ecstasy enreda jovens da elite brasileira

Fonte: Folha de São Paulo

Por ALEXEI BARRIONUEVO

SÃO PAULO, Brasil - Os sinais habituais da vida adolescente de classe alta pareciam surgir com facilidade para Sander Mecca: namoradas, bandas de rock, acesso a clubes da moda -e um intenso consumo de ecstasy. Sem a droga, as raves que duram o fim de semana inteiro não eram a mesma coisa para Mecca, que chegava a consumir seis comprimidos em 12 horas.
Então, aos 21 anos, Mecca foi preso num bar sob acusação de tráfico e passou quase dois anos na cadeia, dormindo ao lado de bandidos calejados e observando outros playboys paulistanos sendo atraídos para a vida do crime organizado.
A história dele tem se tornado mais comum no Brasil, onde a difusão do ecstasy leva uma nova classe de jovens bem-educados a ter problemas com a lei.
Esses novos distribuidores de drogas são muito diferentes dos traficantes fortemente armados e dos seus jovens e miseráveis "soldados" das favelas, onde a polícia brasileira entra com pequenos exércitos para travar violentas batalhas contra as quadrilhas. Os acusados de venderem ecstasy costumam ser universitários ligados ao universo da música eletrônica. Diferenças à parte, o tráfico de drogas está cada vez mais demonizado aos olhos da lei no Brasil, e a elite do país não está sendo poupada.
Recentemente, a Polícia Federal prendeu 55 pessoas, muitas delas no Rio, numa investigação nacional focada em jovens da classe média alta que estariam trazendo ecstasy, LSD e outras drogas sintéticas da Europa para o Brasil.
Em São Paulo, a polícia selecionou raves, boates e universidades de alto nível para fazer longas operações sigilosas. Nos últimos anos, a polícia paulista prendeu centenas de universitários em ações contra o tráfico de ecstasy.
Mesmo assim, as pílulas continuam chegando do exterior, para embalar enormes shows ao ar livre e raves que atraem dezenas de milhares de pessoas e duram dias. A Polícia Federal diz ter apreendido 211 mil comprimidos em 2007, equivalente a 17 vezes o volume do ano anterior, e outras 132.621 pílulas no ano passado.
A ascensão do ecstasy como a droga dos ricos brasileiros abriu ainda mais as portas para que policiais corruptos se aproveitem dos usuários e de suas famílias. Agora que o Brasil substituiu as penas de prisão para usuários de drogas por tratamento ou serviço comunitário, a polícia está extraindo subornos -às vezes de centenas de milhares de dólares- para não indiciar suspeitos de tráfico de ecstasy, segundo advogados de defesa e três traficantes que já cumpriram pena.
"Consumidores e traficantes de ecstasy vêm de um ambiente socioeconômico mais elevado", disse o advogado criminalista Cristiano Maronna, de São Paulo. "Do ponto de vista da polícia, apreender esses indivíduos se torna mais interessante, porque abrirá as portas a possibilidades de corrupção policial."
Adolescentes ricos e de classe média costumam vender ecstasy para sustentar seus gostos extravagantes na cara e agitada vida noturna paulistana, disse o delegado Luiz Carlos Magno, chefe do Denarc (Departamento de Investigações sobre Narcóticos), da Polícia Civil.
Donos de casas noturnas e organizadores de festivais eletrônicos costumam reclamar dessa associação entre droga e música, argumentando que o ecstasy está sendo consumido em todos os lugares, até mesmo em jogos de futebol. Mecca, porém, disse que a conexão é inegável.
"O ecstasy e as raves andam de mãos dadas, e isso não vai parar", disse Mecca, hoje com 26 anos. "Você vai a uma rave aqui e ninguém está sóbrio. Todo o mundo tomou ecstasy ou ácido, e todo o mundo está louco."
A maioria dos passadores de ecstasy compra a droga no exterior, especialmente na Holanda, segundo o delegado Magno. "Os pais têm dinheiro, mas não têm a menor ideia do que sua garotada anda fazendo."
Além disso, a imagem de bandidos exibindo metralhadoras nem passa pela cabeça dos usuários que se viram algemados por venderem ecstasy, ou às vezes por dividirem algumas pílulas com os amigos. "Eles se referem aos traficantes como 'eles', os caras nas favelas", disse Magno.
A lei brasileira protege portadores de diplomas universitários, garantindo-lhes cela especial. Mas a falta de um só crédito para a formatura significa cair no meio da população carcerária geral.
Mecca disse que um conhecido seu da cena clubber, também preso por tráfico de ecstasy, entrou para uma quadrilha na cadeia, pegou gosto pela vida criminosa e saiu de lá como bandido.
"Os playboys acham que, por terem dinheiro, estão acima da lei, e que nada irá afetá-los", disse ele. "Então continuam brincando por aí até que algo sério aconteça. A prisão mudou minha vida."


Colaborou Myrna Domit, em São Paulo